Análise de Black Mirror temporada 7

Crédito: Netflix

A sétima temporada de Black Mirror retorna com sua já tradicional mistura de distopia tecnológica, crítica social e eventos perturbadores. Com seis episódios inéditos, a série continua explorando os limites da relação entre humanidade e tecnologia, dessa vez com temas ainda mais próximos da realidade contemporânea.

Embora a temporada não pareça mais tão profética quanto quando estreou em 2011, os episódios seguem provocativos e inquietantes. A série continua relevante ao tocar em angústias modernas como a dependência de assinaturas digitais e a inteligência artificial.

Episódios centrados em tecnologia e jogos

Nesta temporada, três episódios se destacam por abordarem diretamente o impacto da tecnologia nos jogos, na simulação e nas plataformas digitais. Um deles nos leva de volta ao universo da Infinity, uma espécie de MMO espacial introduzido na quarta temporada. Outro mergulha no fascínio e perigo de jogos que simulam vida com uma complexidade perturbadora.

Já o episódio “Plaything”, ambientado nos anos 1990, resgata a nostalgia gamer ao acompanhar um jornalista de revistas de informática — como a antiga PC Zone — que testa um jogo inédito de criatura artificial chamado Thronglets. Apesar da atmosfera carregada de referências a hardwares clássicos, como o Atari Jaguar e placas Sound Blaster, o episódio se sustenta mais pelo visual retrô e emoção nostálgica do que por um roteiro sólido.

A proposta de "sims" com vida própria, baseada em tecnologias como redes neurais (inspiradas no jogo real “Creatures” de 1996), é instigante, mas o episódio encerra sem explorar a fundo as implicações filosóficas que propõe. Ainda assim, deixa rastros de reflexão sobre os limites entre simulação e consciência digital.

O pesadelo da economia por assinatura

O episódio mais impactante da temporada, e também o mais elogiado, é “Common People”. A trama acompanha Amanda (Rashida Jones), uma professora que depende de um arranjo médico inovador (e privado) para sobreviver após um grave problema de saúde. A empresa Rivermind propõe uma solução baseada em nuvem: transferência parcial das funções cerebrais para servidores remotos — mediante pagamento mensal, é claro.

A crítica ao modelo de assinaturas é direta e poderosa. Hoje, dependemos de mensalidades para consumo de músicas, filmes, aplicativos e até serviços domésticos. “Common People” eleva isso à máxima tensão ao sugerir que até nossa consciência e saúde podem se tornar reféns desse modelo. O dilema entre necessidade vital e dependência corporativa é apresentado de forma sutil, porém implacável.

A série denuncia a perda de controle do indivíduo diante de produtos que antes eram bens duráveis e que agora são alugados. A crítica é intensificada ao mostrar como até a soberania sobre nossas mentes pode estar à mercê de licenças e cláusulas contratuais.

O vício digital em tela, literalmente

A participação de jogos contemporâneos é outro detalhe que conecta espectador e enredo. Em determinada cena de Season 7, um personagem é visto jogando Balatro, game de construção de baralho que o próprio criador da série, Charlie Brooker, descreveu como “possivelmente a coisa mais viciante já criada”. Essa integração de referências da cultura digital real ajuda a colocar Black Mirror cada vez mais próxima da vida cotidiana — para o bem e para o mal.

Esses momentos também servem como metacrítica ao comportamento da audiência na era dos algoritmos e da hiperconectividade. Assim como os episódios nos chocam, também podemos estar jogando, assistindo ou rolando feeds em tempo real — um loop de consumo passivo que foge durante poucos minutos da autorreflexão que a série tanto provoca. Um espelho negro, aliás.

Reflexões finais sobre a temporada

A sétima temporada mantém a essência perturbadora de Black Mirror, mesmo que alguns episódios sejam mais contemplativos do que arrepiantes. O poder da série está em trazer à tona medos tangíveis, não distopias impossíveis.

Se antes a série imaginava um futuro sombrio e distante, agora o terror é imediato: contratos digitais com consequências irreversíveis, softwares que interpretam e replicam comportamento humano, redes sociais que moldam regras sociais e jogos que simulam humanidade com mais emoção do que algumas pessoas reais.

Não é a melhor temporada da série, mas é uma boa amostra de que ainda há espaço para ideias provocadoras. Mesmo que o horror não venha de monstros ou alienígenas, o reflexo que vemos nessas telas — pretas ou não — segue sendo desconcertante.

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