A febre dos cards colecionáveis ganhou um novo significado no Japão — e está conquistando corações com uma proposta inusitada: homenagear homens comuns, de meia-idade. Um projeto local transformou moradores em verdadeiros heróis de carta, e está provocando uma revolução no modo como as comunidades se conectam em Kawara, na prefeitura de Fukuoka.
O tradicional baralho de criaturas místicas foi temporariamente deixado de lado, substituído por retratos carismáticos de senhores simpáticos que vivem — e fazem a diferença — na cidade. Chamado de "Ojisan Cards", o jogo nasceu de uma iniciativa com propósito social, mas viralizou de forma orgânica e envolvente.
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Uma iniciativa comunitária que virou fenômeno cultural
O jogo de cartas foi idealizado por Eri Miyahara, secretária-geral do Conselho Comunitário de Saidosho. O objetivo era aproximar os jovens da cidade dos idosos locais, que muitas vezes viviam distantes das novas gerações. E como fazer isso de maneira criativa? Tornando-os figuras colecionáveis em um jogo de cartas.
Antes pensado apenas como item de coleção, o jogo rapidamente evoluiu. A comunidade começou a notar que algumas cartas se destacavam por suas estatísticas, como HP (pontos de vida)e MP (pontos mágicos). A empolgação dos jovens levou à criação de regras de duelo, mas com um viés bem diferente: em vez de derrotar inimigos, os jogadores usavam as habilidades reais e profissionais dos homens representados para "superar" o adversário.
Quem são os “heróis” deste baralho?
Cada carta retrata um homem real da cidade, trazendo informações sobre sua ocupação, talentos e personalidade. Entre os destaques, estão:
- Ex-chefe do corpo de bombeiros, um símbolo de proteção e confiança.
- Hobbyista de miniaturas, especializado em montar qualquer tipo de modelo.
- Instrutor de oficina de soba, referência gastronômica da cidade.
A carta mais cobiçada é a do senhor Daimitsu Fujii, de 68 anos. Ex-agente penitenciário, ele ganhou fama ao ostentar os maiores valores de HP e MP no baralho. Tamanha popularidade fez com que crianças pedissem autógrafos e o reverenciassem como "o homem da carta".
Impacto na cidade e envolvimento social
Mais que uma brincadeira, o projeto tem contribuído para fortalecer os laços sociais. Segundo Miyahara, desde a viralização do jogo, aumentou significativamente a participação de jovens em eventos voluntários. Além disso, homens que antes passavam despercebidos, agora sentem-se valorizados e motivados. Crianças que antes não conversavam com os vizinhos, hoje os veem como “heróis que você pode encontrar na rua”.
Esse novo relacionamento intergeracional é visto como crucial para revitalizar o senso de comunidade. Em tempos em que muitos jovens deixam as cidades do interior, Kawara oferece um exemplo positivo ao transformar conexões humanas em uma experiência de jogo.
Comercialização e sucesso crescente
A popularidade das Ojisan Cards disparou. As cartas são vendidas apenas no Centro Comunitário de Saidosho. Os preços variam:
- ¥100(aproximadamente R$ 3,50): um pacote com três cartas comuns.
- ¥500(cerca de R$ 17,50): pacote com seis cartas, podendo conter uma versão "brilhante" de um senhor.
A procura é tanta que os estoques se esgotam rapidamente, tornando itens simples em objetos de desejo para colecionadores locais. A ideia se mostrou tão eficaz que se espalhou para outras regiões do Japão: na Prefeitura de Aomori, por exemplo, surgiu um jogo similar com pescadores vestidos como Kappa, personagens folclóricos japoneses.
Conclusão: uma nova era para os jogos de cartas
Em tempos de tecnologia avançada, realidade aumentada e inteligência artificial, uma das tendências mais quentes do momento no Japão aposta no oposto: a valorização do humano, do cotidiano, do real. E isso está funcionando.
Não se trata apenas de nostalgia ou de colecionar curiosidades. O sucesso das Ojisan Cards comprova que jogos também podem ser ferramentas de transformação, construção de identidade e vínculo com a comunidade.
E, para muitos, depois de conhecer essas cartas tão singelas e divertidas, nenhum outro jogo parece tão importante.